TEMA: A Noite dos Assassinos - matéria de jornal

José Inácio, Lúcia Nascimento e Leda Nascimento em A Noite dos Assassinos de José. Direção de Reynaldo Faray. Teatro Arthur Azevedo, 1971.

Abaixo um texo escrito por Aldo Leite no jornal O Estado do Maranhão no dia da estréia do espetáculo.
 
“A NOITE DOS ASSASSINOS”

Quando Alberto Guzik, crítico teatral e Professor da Universidade de São Paulo escreveu nos jornais paulistas um artigo sôbre o movimento teatral maranhense, cujo título foi “UMA GRATA SURPRESA: EXISTE TEATRO NO MARANHÃO”, nada mais fez que constatar uma realidade que há mais de dez anos tem se estruturado em São Luís.
Do Professor Telésforo Rego, de Carlos Cardenas, Francisco Costa e outros, não nos compete analisá-los em termos críticos, estéticos, etc., e sim lembrá-los como alguns maranhenses que mantinham grupos de teatro por aqui. Surgia também Ubiratan Teixeira saído de um aprendizado no Rio de Janeiro e em Paris através do Teatro Duse do devotado Paschoal Carlos Magno que iniciou um movimento onde encenava entre outros autores, o nosso excelente Fernando Moreira. “As contingências da vida” entretanto, levaram-no a outros caminhos e hoje lamentamos a sua ausência no panorama do nosso teatro. Mais ou menos nessa época, volta a São Luís Reynaldo Faray vindo do Rio de Janeiro onde cursou a Escola de Arte Dramática da atriz Dulcina de Moraes; e, através do SESC-SENAC e do Clube das Mães, desenvolve um movimento artístico cujo valor torna-se desnecessário ressaltar ante a evidência dos fatos. E foi através desta iniciativa de empenho total, de raça, de amor, que saiu toda uma geração que hoje atua em diversos setores ligados à arte em nossa cidade. Orlandira Matos, Facury Heluy, Eugênio Giusti, Lucia e Leda Nascimento, Regina Teles, Concita Ramos, Leônidas Carvalho entre outros, iniciaram, aprenderam as primeiras lições de teatro com Reynaldo Faray.
O objetivo deste artigo, não é fazer um levantamento histórico do movimento teatral em S. Luís, apenas darmos uma olhada ao passado para chegarmos até hoje, quando estréia no Teatro Artur Azevedo, “A NOITE DOS ASSASSINOS”.
Esclareço também que não sou dado a gratuidades, não me ufano de ser maranhense, tampouco de pertencer ao Seminário de Teatro, porém sinto-me obrigado em virtude da minha futura função (sou aluno do 4° ano, da Faculdade de Comunicações da Universidade de São Paulo) a comentar o espetáculo, analisar o texto, direção, trabalho dos autores, cenografia, etc...
- Numa sociedade repressiva, onde os valores humanos individuais, são postos de lado em função do certo e do errado, do belo e do feio, um casal alienado, frustrado nas suas funções de esposos, pais, seres humanos enfim, transmite aos seus 3 filhos, toda uma carga neurótica, asfixiante, que somente após um exercício diário, onde planejam o extermínio dos pais, conseguem suavisar as suas tensões emocionais.
E é justamente neste exercício que o autor José Triana, arma a sua trama.
Desconhecendo outras obras do autor, torna-se impossível analizá-lo com mais detalhes, enquadrá-lo dentro de uma escola etc. Entretanto a partir deste texto, sente-se a sua forte tendência ao simbolismo e também ao expressionismo. Muito bem estruturado dramaturgicamente, os conflitos, se alternam numa seqüência lógica, ordenada chegando ao clímax após as varias seqüências dramáticas do exercício, quando extenuados, sentem-se atraídos a uma nova investida, a uma nova representação das suas angustias. É a forma como os três filhos livram-se das suas angustias, rebelam-se contra os conceitos e normas de pais castradores, possessivos. É no porão da casa, que procuram vingar-se do mundo exterior, de todo um círculo onde são incapazes de sair.
Não se trata de um texto “bonitinho” com começo meio e fim, tampouco o cenário ou, a excelente direção de Reynaldo Faray se prende a efeitos plásticos etc., antes, é um cenário caótico, desorganizado e a direção sem marcas grandiosas, consegue criar um clima de tensão, de angústia, de opressão até não só aos atores, como ao espectador.
Lúcia Nascimento, Leda Nascimento e José Inácio são os três filhos. E, não fora um trabalho demorado o resultado seria desastroso, devido às variadas transformações que sofrem em cena. Lúcia Nascimento alcança momentos extraordinários de composição de personagem ao interpretar um Promotor. Lêda consegue um dos mais difíceis modos de representar. Parada, estática, transmite toda uma carga emocional, e o melhor, passa de um personagem a outro sem uma fala sequer. Assim também é o caso de José Inácio, como o Lalo angustiado, revoltado ante a tirania dos pais, resolve o seu trabalho com a eficiência já conseguida em muitas outras peças.
Ao leitor, ao espectador maranhense, fica portanto o lembrete de que mais do que nunca é preciso assistir o resultado de um trabalho sério, de um trabalho de dedicação inteira, de amor e de qualidade. Torna-se necessário que vibrem com os resultados obtidos com as montagens do Seminário Permanente de Teatro, com o trabalho abnegado de Tácito Borralho frente ao Laborarte. E cabe também aos nossos escritores, a Fernando Moreira, a José Chagas, Bernardo Tajra, Erasmo Dias, P. Mohana, Américo Azevedo, Nauro Machado entre outros, compreenderem a necessidade que temos de encenar nossas coisas, nossa problemática, nossos conflitos. E não é sempre que deparamos com textos que existe a universidade do tema como é o caso de “A NOITE DOS ASSASSINOS”.

ALDO LEITE

 Transcrito de: O Estado do Maranhão. São Luís, quinta-feira, 29/11/73.

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